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Consumo consciente transforma indústria da moda 

Práticas sustentáveis são saída para minimizar impactos ambientais gerados pela indústria têxtil 

 Por Aline Vitória e Joyce Moser

A indústria da moda apesar da grande importância econômica, é a segunda indústria mais poluente. Os impactos causados pela poluição são os mais diversos. Devido ao consumismo e a produção exacerbada e desenfreada, algumas alternativas estão sendo desenvolvidas para melhorar o cenário atual, como as práticas de consumo consciente e sustentável. Entenda como esses movimentos vêm ganhando visibilidade.

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 O relatório “Uma nova economia têxtil: redesenhando o futuro da moda”, publicado em 2017, originalmente em inglês pela Fundação Ellen Macarthur em parceria com a Nike, H&M e a C&A, apresenta dados sobre o impacto dos resíduos têxteis no meio ambiente.  Esse relatório apontou que a indústria têxtil depende de 98 milhões de toneladas por ano de recursos não renováveis, os quais evolvem fertilizantes para cultivar o algodão, petróleo para produzir as fibras sintéticas e outros químicos utilizados para tingir e finalizar as fibras têxteis. 

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​O uso da água na produção têxtil também é algo crítico. Segundo o relatório, são utilizados milhões de metros cúbicos no processo de produção que contribuem para problemas de seca em algumas regiões do planeta e a contaminação dos cursos de água pelos resíduos industriais. O relatório também apresenta dados sobre as microfibras de plástico. Por ano são liberados durante a lavagem das roupas meio milhão de toneladas desse material que vão para os oceanos.  

Infográfico: Como a indústria da moda polui tanto - Produzido por: Aline Vitória 

 No Brasil, a indústria têxtil é o segundo setor que mais emprega na indústria de transformação - que transforma material primário em produto final ou intermediário para outra indústria de transformação - com aproximadamente 1,6 milhões de empregos diretos. Além do país ser o 5º maior produtor mundial de têxteis, de acordo com a Abit - Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção.   

 

Thaiana Eger, que é estilista e trabalha na área há 14 anos fala um pouco sobre a importância dessa conscientização das indústrias têxteis.  Ela diz que os efeitos climáticos estão sendo causados por essas décadas de revolução industrial de massa onde o mais importante é o crescimento e o capitalismo predatório. “Não devemos só criar mais materiais que um dia serão lixo que levam milhares de anos para se decompor. A terra, o mar e toda natureza sofrem as consequências cada dia mais”, argumenta.   

 

Além disso ela também explica como a indústria está adotando práticas de produção sustentáveis. “Muitos adotam apenas como marketing, mas o ideal é trabalhar com malhas com menos impacto ambiental, tingimentos naturais, malhas de reciclagem com aproveitamentos de fios, algodão orgânico e menos itens com poliéster proveniente do petróleo. Produção por demanda, para não ficar com altos estoques de matéria sem uso, reciclagem de materiais, sem contar na parte ética da mão de obra sendo valorizada”, explica a estilista.   

 

 Henriette Martina Beilfuss, gerente de produto na empresa Biogás, marca indaialense que trabalha com o segmento masculino nas linhas bebê, infantil, juvenil e adulto, explica como a empresa está implementando essas práticas sustentáveis. “A iniciativa de implementação do conceito de moda sustentável veio do desejo de fazer a diferença no mundo.  Do desejo de incluir práticas e ações em benefício do cuidado com o meio ambiente. Estamos cientes da nossa responsabilidade com o futuro do planeta como empresa e como indivíduos.  Por isso é tão importante começar, planejar e implementar o conceito de moda sustentável”, conta.   

 

Henriette também explica que a cadeia têxtil é muito grande e complexa, que são muitos processos envolvidos. A empresa está planejando a coleção Primavera/Verão - 2021/2022 e estão abordando o tema da sustentabilidade. 

“Se você me perguntar as peças são sustentáveis eu vou responder que não.  Alguns tecidos são de algodão orgânico certificado, moletom de fibras de garrafa pet, tecidos desfibrados, mas apenas 10% da coleção é assim.  Essa matéria prima especial e sustentável é muito cara e inviável ainda.  Queremos impactar de forma positiva nosso consumidor através das estampas, de fotos conceito ativistas, através de mensagens em nossas embalagens e mídias sociais”, declara.  

Na empresa são produzidas 1,5 milhões de peças por ano. Henriette diz que podem impactar muitas pessoas se 20% dessas peças tiverem estampas com mensagens positivas e ativistas, além das tags nas peças alertando sobre o descarte correto das embalagens. “Queremos fazer o básico, começar de dentro para fora.  Nosso trabalho se baseia no uso responsável dos recursos, garantindo a segurança das pessoas e do meio ambiente. Internamente já temos muitas práticas amigas do meio ambiente. Todo nosso lixo é reciclado e separado, nossos resíduos têxteis têm o destino correto e segue para empresas que desfibram esses tecidos para que voltem repaginados para o mercado. Enfim, um começo desafiador e que estamos dispostos a enfrentar”, afirma.  

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O que é moda consciente  e moda sustentável?  

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Apesar de estarem relacionados com o mesmo tema, os conceitos de moda consciente e moda sustentável tem algumas diferenças. A moda consciente é um estilo de consumo, em que a responsabilidade fica por conta de cada indivíduo. Ela pode ser praticada a partir de diversas ações que podem impactar positivamente o futuro da moda. As pessoas que aderem esse tipo de consumo compram somente o que vão usar, nada de exageros, para não deixar peças paradas no guarda-roupa. O ideal é não levar em consideração apenas a “tendência” e o custo das peças, mas lembrar de quantos processos as roupas passaram até chegar até o cliente e valorizar o trabalho das marcas que se preocupam com tecnologia e o meio ambiente. Outras opções quando se fala em moda consciente é a customização das peças, doação e também apostar em brechós.  

Brechó Mundo Barth - Loja Física 

Foto: Joyce Moser

Quando uma roupa não tem mais uso para alguém, em vez dela seguir para os aterros sanitários, os chamados “lixões”, se ela está em boas condições, os brechós são ótimas opções. Os brechós não vendem somente roupas usadas e velhas ou de pessoas que já morreram. Os brechós estão se tornando uma atividade comercial sustentável, que faz essas movimentações, fazendo com que as peças não fiquem estragando guardadas. Além de ser uma prática sustentável, ela também é mais barata.    

 

O Mundo Barth é um brechó situado na cidade de Blumenau, que surgiu em 2014, quando a proprietária Vanessa Barth tinha algumas peças de roupa para vender e anunciou na internet. Depois de um bazar em família, que era para ser um troca troca, ela não trocou e só lucrou com as peças. Assim surgiu a ideia e a oportunidade de fazer alguma coisa para ter uma renda extra. Desde fevereiro de 2020 o Mundo Barth conta com uma ampla loja física, além das vendas pela internet. A sustentabilidade se baseia em três pilares: ambiental, social e econômico e a maioria dos brechós nasceu por causa do pilar ambiental.  

Vanessa Barth - Proprietária do Mundo Barth

Foto: Joyce Moser

“Os consumidores hoje cobram muito socialmente maior transparência também nessa cadeia produtiva. Cada peça que adquirimos tem um recurso a menos no planeta e precisamos estar extremamente conscientes disso. O reaproveitamento vai diminuir muito o descarte, então, nós não podemos deixar de refletir sobre esse assunto”, afirma Carlota Di Pietro, produtora executiva de moda que trabalha na área de eventos e catálogos de moda há mais de 15 anos. 

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Para Vanessa, o Mundo Barth, apesar de ter a preocupação ambiental, surgiu por conta do social e econômico.  “Existem milhares de pessoas que são exploradas anualmente, diariamente por ganhar muito pouco e ter condições quase miseráveis para fabricar uma peça [...] Essa é uma das coisas que a gente luta contra, tu não precisa comprar uma peça nova sabendo que uma pessoa lá daquele país ganhou centavos, tu pode comprar uma peça aqui do Mundo Barth ou em outro brechó da cidade, que você está ajudando o negócio local”, declara a empreendedora.  

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Veja a entrevista sobre o brechó na íntegra com Vanessa Barth...

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Para Carlota, a preocupação com o meio ambiente está menos em alta do que deveria. “Muito se fala, mas eu acho que as ações concretas ainda são poucas. Poucas marcas ainda adotam e adotarão essa postura, até porque o custo de se adotar uma postura cuidando mais do meio ambiente, se torna mais alto. Nesse mundo globalizado novos perfis de consumidores surgiram, mais politizados e consequentemente mais conscientes, são mais rigorosos, com acesso muito fácil a informação, então, exige cada vez mais um posicionamento das marcas e da indústria para que se comprometam com esses valores e tenham realmente práticas sustentáveis”, explica.  

Carlota Di Pietro - Produtora de Moda 

Foto: Arquivo pessoal 

Consumidor consciente 

 

A jornalista Alice Kienen, diz que depois que começou a entender um pouco melhor sobre o consumo, de como as coisas são produzidas e de todo impacto que a questão da moda tem no meio ambiente foi impossível fechar os olhos para o assunto. “Eu acho muito complicado a forma desenfreada como a gente compra e eu tenho muito isso no meu passado também. Eu era uma adolescente muito consumista, era normal pra mim, comprar roupa e a roupa ficar com etiqueta no armário e eu não via problema nisso”, conta.   

Alice explica que em Blumenau tem muitas marcas que produzem de forma consciente, que reutilizam tecidos e fazem tudo de uma forma que prejudique menos o meio ambiente e também os brechós. Ela explica que começou a conhecer mais das marcas regionais de produção própria.

“Hoje em dia basicamente todas as marcas que eu consumo são de produção local, a maioria utiliza tecidos reutilizáveis”, assegura.  

Alice Kienen - Jornalista. Na foto utilizando roupas de tecido reaproveitado - Foto: Arquivo pessoal 

A estudante Juliana Bertelli, de 17 anos, está na busca por uma vida mais sustentável. “O desejo da vida mais sustentável já me acompanha há alguns anos, porém a vontade de reorganizar o guarda roupa de uma forma mais inteligente surgiu quando vi uma mulher que acompanho no Instagram mostrando que todas suas roupas cabiam em uma mala de viagem. Ela propositalmente reorganizou a maneira de se vestir para coincidir com seu estilo de vida. Eu achei aquilo tão incrível e instigante que pensei comigo mesma “quantas malas precisariam para levar toda essa minha bagunça”, conta.  

 

No início, Juliana acreditava que um guarda-roupa prático é composto somente por peças pretas e brancas, mas na verdade não é bem assim. 

“Um guarda roupa cápsula como costumamos chamar, é um guarda roupa que atende seu estilo de vida e que realmente combina com você. Eu mesma guardava pilhas de roupas pensando “Ah, quando eu perder peso vou usar essa blusinha”, ou então “Ah, mas um dia vou comprar algo que combine com essa saia”, “um dia vou fazer um look lindo com esse casaco” e por aí vai. No momento que você separa o que realmente usa do “um dia vou usar” você percebe que realmente seu guarda roupa não é nada versátil e muito menos iria caber em uma só mala de viagem”, declara a estudante.   

Juliana - Estudante 

Foto: Arquivo pessoal 

É importante começar pelas peças que você já tem. Para Juliana não é algo fácil, mas tem uma coisa que a motiva, que é a doação das peças. “Saber que algo realmente será usado e trará alegria a outras pessoas me dá ânimo para continuar”, garante.  

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Alice diz que a internet facilita bastante essa descoberta de novos lugares para encontrar peças produzidas de maneira sustentável, o que ela faz é se cercar de assuntos que lhe interessam. “Eu sigo bastante pessoas que falam de consumo consciente e acabo recebendo dicas de lugares que eu não conhecia. Então, por exemplo, eu já descobri brechós aqui em Blumenau porque eu seguia alguém que também frequentava”, afirma a jornalista.    

  

Mudança de estilo de vida 

Para quem pretende adquirir essas práticas sustentáveis e conscientes, Carlota aconselha que as pessoas iniciem, não deixem para amanhã e instalem isso no lifestyle, iniciando pelos pequenos hábitos do dia a dia. Ela dá algumas dicas para quem acha que não é possível ter um guarda-roupa variado com poucas peças.   

 

·         Compre com assertividade: peças que combinem com você e do seu tamanho

·         Recicle; 

·         Ouse: usar as peças de formas improváveis, fazer com que poucas peças virem muitas outras; 

·         Faça mix de estampas e texturas 

·         Sobreponha:  acessórios, colares, cintos, tecidos... você pode totalmente transformar um look 

·         Use terceira e quarta peça: agrega no look e você não repete a mesma roupa com a mesma cara de sempre 

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